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Um inédito DÓ

Contracapa original do livro
Antonio Fasanaro, em artigo de jornal, traz à lume um inédito “Dó”, livro de Silvino Olavo. Dividido em quatro partes, segundo aquele estudo, a obra traduz tristezas e alegrias.
A primeira parte (Os poemas do meu irmão) denota o pesar que há nos versos que abrem o livro:
 “Alma penada, alma que choras
descansa a fronte em minha fronte,
as minhas lágrimas sonoras
são como as lágrimas da fonte
..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... .....”

Reflete que Silvino chora calado aquela dor, “sem rumores, envolto no traje sombrio do silêncio”. Mas sofre, piedosamente, a dor dos outros, a dor alheia:
“Pranto calado de quem sofre
a dor alheia como a sua
e faz do coração um cofre
onde recolhe a dor da rua
..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... ..... .....”

A segunda parte – Novo Mundo – demonstra a “brasilidade” do poeta, revelando o seu poder de expressão e, confessando um crime bárbaro: ser poeta! Neste ponto, acrescenta Fasanaro: “Belo crime, esse de nascer poeta”.
E parafraseando o próprio vate, em seu ineditismo, diga-se de passagem: “Oh, glória triste a de não ser artista!”, onde se vê a preferência prima, que optou o ilustre esperancense. Como se diz em latim: Nascuntum poetas...
Fasanaro admira o autor, que se veste de camisa de seda, com emblema heráldico de nobreza poética das mais puras: A tristeza.
“...tristeza que lê versos de Espronceda
gosta de frequentar a grande-roda,
uma camisa de seda
e veste jaquetão talhado à moda...”

Tristeza Americana – terça parte do livro – traz aspectos da paisagem equatoriana, onde “as florestas amazônicas espantam e ironizam o gênero homo sapiens”, sendo filha:
“... da floresta opulenta donde emana
o saudável perfume de baunilha...
Do oceano sem fim que se engalana
de alvos farrapos frágeis de escumilha
... e das noites do luar de panorama
desse luar que tanto bem derrama
na minha alma sonâmbula e andarilha...”

Na última divisão do livro – Poemas da Enviada – ressoa um modernismo equilibrado, afastando-se da tradição dos sonetos, com criteriosa renovação estética dos “novos” tempos.
Observa-se, nesta obra, muita sentimentalidade. O livro em si é carregado de emoção, trazendo de início o tema da morte, passeando pela vida, respirando o ar de natureza e, finalmente, abrindo-se para o modernismo.
Não é à toa que, pouco tempo depois, escreve Silvino à Mário de Andrade, aquele autor de “Macunaína”, de quem foi cicerone na Parahyba, de quando de suas viagens de turista aprendiz. Em carta, remete ao amigo escritor os seus poemas da “Enviada”, com uma recomendação: “Entrego-lhos. O que fizer está bem feito” (MA-C-CPL5504).
O crítico vê na arte de Silvino algo de originalidade, “nos lentos passeios introspectivos da alameda da fantasia”, que “impressiona pela espontaneidade dos motivos e pela elegância da forma, (...) Ele é sincero na sua arte como na sua vida”.
Foram esses anseios, na sua opinião, que lhe fizeram deixar a sua terra natal – Esperança – para percorrer o mundo na ânsia pela sabedoria dos livros, para ensinar-nos este conhecimento que adquirira ao longo de sua existência.
Antônio Fasanaro, faz uma síntese de sua busca: “Se ele  houvera ficado na quietude de sua aldeia hoje seria um honrado lojista e pacato conselheiro municipal”.
Pois bem, o seu genitor, Coronel Manuel Cândido, o queria a frente dos negócios da família, como próspero comerciante e criador de gados; e talvez pela sua eloquência, chegaria ao legislativo mirim, ocupando uma das cadeiras no Conselho Municipal.
Uns dizem que foi o amor não correspondido, que fê-lo sair e procurar refúgio na capital parahybana, onde galgou notório reconhecimento por sua atividade acadêmica. Mas não sem deixar de ser, um garoto como outro qualquer, que “abalou até os primos de terceiro grau todos boquiabertos com as diabruras do menino”.
Quero crer – como Fasanaro – que lhe moveu “essa ânsia para o cérebro de então misteriosa, instinto de ser  poeta, porque assim nascera”. Ele possuía aquela inquietude para estudar, servindo-lhe de antemão o baú e a rede da bondosa tia Henriqueta Maribondo.
Nas palavras de José Américo de Almeida (autor d’A Bagaceira), “Se Silvino Olavo não nasceu poeta – qualquer direito de nascimento está fora da moda – apareceu, pelo menos, como poeta feito”.
Porém, o melhor ele guardava para si, coisa que revela em seu poema intitulado SEGREDO:
“Não, meu bem,
não direi
Não direi o que sei nunca a ninguém”

O segredo – posso revelar – é que em 1927, partira o vate para o Rio, onde publicou o seu inédito “Dó”, sob o título de “Sombra Iluminada”. Fasanaro, em Pernambuco, foi o primeiro, que se tem notícias, a ter em mãos os manuscritos daquele livro poético, inclusive com alguns versos que foram omitidos na edição cariosa.

Rau Ferreira


Referências:
- DIÁRIO DE PERNAMBUCO, Jornal. Edição de 08 de agosto. Recife/PE: 1926.
- DIÁRIO DE PERNAMBUCO, Jornal. Edição de 14 de julho. Recife/PE: 1926.
- DIÁRIO DE PERNAMBUCO, Jornal. Edição de 17 de julho. Recife/PE: 1926.
- FERREIRA, Rau. Silvino Olavo. Edições Banabuyé. Epgraf. Esperança/PB: 2010.
- IEB/USP. Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Carta de Silvino Olavo à Mário de Andrade. Acervo: MA-C-CPL5504. Envio de poemas, desejando publicá-los. Data 10 de maio de 1930.

- MAURÍCIO, João de Deus. A vida dramática de Silvino Olavo. Unigraf. João Pessoa/PB: 1992.

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